31 agosto 2008

Conversa na madruga (Para Marlos e Carla, os protagonistas da cena....KKKKKKKKKK)

Virou-se na cama pela décima vez tentando ajeitar-se numa posição que permitisse a chegada do sono. Olhou para o lado e viu o marido roncando e dormindo satisfeito. Deu um cutucão disfarçado pra ver se ele acordava e nada. Mexeu-se com mais força e só conseguiu fazer com que ele desse uma viradinha na cama.
Sem poder suportar mais a solidão e o escuro do quarto, chamou por ele:
_ Bem?
_ Hummm...
_Acorda! Eu tô sem sono! Conversa comigo.
Dele conseguiu ouvir somente uma reclamação do tipo:
_ Ah não, me deixe dormir. E Durma também!
Pronto! Foi o suficiente pra começar uma discussão. Acendeu a luz e desandou a falar.
Disse que não havia mais diálogo entre os dois e que ele não conseguia ser companheiro nem numa coisa simples como uma insônia. Ele ficou tentando ignorar, mas ela falou tanto que o sono dele acabou por tomar chá de sumiço.
Disposto a conversar, começou a se desculpar:
_ Não é isso, amor! É que eu estava com muito sono. Mas se você quer tanto vamos conversar então.
Começaram a conversar. Ele falou do dia que tinha sido longo, discutiu questões sobre o andamento da reforma que estavam fazendo e perguntou pra ela:
_ O que vc acha do piso novo que eu escolhi?
Nenhuma resposta. Virou-se pra ela e lá estava a esposa com os olhos pesados prestes a dormir.
Tentou manter a conversa, insistiu no assunto e só tinha dela respostas vagas e curtas.
Indignado, quis saber:
_ Você não vai falar comigo não? Vai me deixar falando sozinho agora que perdi o sono por sua causa?
Ela, com a cara mais normal do mundo respondeu-lhe:
_ Ai amor, sabe o que é? Estou muito cansada, com muito sono e tenho que levantar muito cedo amanhã.
Possesso, ele ainda insistiu:
_Não acredito! Logo agora que eu queria conversar?
Ela, com a voz pastosa disse:
_Então, amor, deixa essa conversa pra amanhã, deixa? Boa noite.
Virou-se para o canto e dormiu em menos de cinco minutos.
Ele não deixou por menos. Começou a falar sem parar que não conseguiam mais conversar, que ela não era companheira, que não o ouvia etc. E enquanto falava o único movimento que ela fez foi o de levantar-se da cama com as cobertas e o travesseiro na mão.
Interrompendo sua ladainha ele quis saber:
_Onde você vai?
Ao que ela respondeu de pronto:
_Dormir no quarto do Júnior porque do seu lado é mesmo impossível dormir.

28 agosto 2008

Lá vou eu de novo...

"Nunca mais vou me apaixonar!", pensou consigo Aninha, enquanto enxugava a última lágrima antes de apagar a luz e tentar dormir. Naquela noite chorou até ficar desidratada e acordou com os olhos de quem levou uns sopapos. E levou mesmo! Do destino.
Depois de meses de um tórrido namoro, que ela jurava que ia acabar no altar, o tal que ela nem ousava repetir o nome dera-lhe um homérico pé na bunda por causa de outra. Outra que agora parecia mais bonita, mais simpática, mais inteligente e muito mais esperta que ela, já que lhe tomou o namorado sem cerimônia.
Passou dias de cão, renegando sua condição de mulher e torcendo pra nascer homem na próxima encarnação. Trabalhou feito louca, dormiu em todas as horas ociosas e inventou milhões de tarefas pra realizar. Tudo pra não se lembrar dos momentos ao lado do ex. Quando se sentiu pronta, falou no assunto. Fez que não ligava mais, mas seus olhos a traíram e ela acabou por se entregar a uma torrente de lágrimas jurando que era a última vez que se apaixonava. " Não quero mais compromisso, só quero me divertir e ponto!"
Ajudada pelas amigas voltou a sair, colocou em dia a depilação, deu um trato nas melenas, enfim superou os dias difíceis, parou de chorar e deu a volta por cima. Sempre repetindo que não queria saber de homem, pelo menos não queria saber de compromisso com ninguém. Quando alguém dava mostras de paixão, fazia cara de pena e lamentava pela pessoa, vangloriando-se do seu imenso autocontrole. "Bem faço eu, que não me apaixono mais!", eram suas palavras cotidianas. Alguns a invejavam por sua capacidade, outros tinham dó de sua solidão quase constante. Muitos até a repreendiam por dispensar alguns bons partidos sem sequer lhes dar a chance de uma conversa.
Ela, mantinha-se impassível, do alto de sua segurança de pessoa não apaixonada. Isso até conhecer o Paulinho...
O Paulinho? Ele era tudo de bom! Bonito, inteligente, perfumado e um pé de valsa. As amigas caíram de amores pelo cara, mas ela resistiu, dizendo que esses eram os mais perigosos. Passaram a conviver, saíam juntos e ela jurava que ele não era mais que um amigo. Mas o Paulinho? Esse era homem vivido e entendia os medos da Aninha, principalmente depois de conhecer sua história. Ele admirava o carisma daquela mulher linda, inteligente e estava completamente apaixonado.
Aninha só pensava nele, mas não se permitia relaxar com aquele sentimento. Resultado? Afastou-se. Ele fez o que pôde pra se aproximar e com a ajuda das amigas conseguiu armar um encontro. Inocente, Aninha foi para uma reunião na casa de uma amiga. Foi do jeito que estava porque não tivera ânimo para uma produção mais elaborada. Seu astral não estava dos melhores.
Quase caiu pra trás e saiu correndo pra casa quando deu de cara com o Paulinho abrindo a porta todo perfumado e de frente para uma mesa arrumada por ele com velas e flores.
Com tanta gentileza não pôde recusar o convite e jantou com ele. Envolvida pela música curtiu momentos agradáveis e não se lembrou nem da forma como estava vestida.
Lembrou-se da noite em que chorara meses atrás por causa de alguém e da promessa que havia feito a sim mesma. Tão absorta estava em seus pensamentos que nem notou o Paulinho se aproximando lentamente. Quando deu por si ele ele já estava com os lábios a meio centímetro dos seus e ela ficou hipnotizada com aquela proximidade.
Num segundo que pareceu durar um século, recapitulou os meses anteriores àquela noite. Os dias de lágrima, a superação, as saídas sem compromisso, a solidão do seu quarto, noites em claro sem alguém pra conversar... Não teve tempo para se lembrar de mais nada, já que Paulinho tascou-lhe um beijão daqueles de cinema. Resistindo a princípio, ela ainda teve tempo de pensar: " Lá vou eu de novo!" .

01 agosto 2008

Moderno instrumento de tortura! Para poucas...

Saiu de casa pontualmente às oito. "Atrasada, pra variar!", foi o que pensou. Tentando andar o mais rápido que podia, perguntou-se pela segunda vez por que cargas d'água colocou aquele sapato preto, bico e salto finos, que ficou liiiindo, mas estava comendo o seu pobre calcanhar. A primeira foi no ato de calçar o pisante, que custou baratinho e realmente era um modelo charmosinho.
Não era só pra estar bonita, pensou, porque seu conforto sempre esteve diretamente proporcional a sua auto-estima. Quanto mais à vontade estivesse, maior era seu bem estar. Não naquela manhã...
Subindo a rua, sentiu-se linda e olhada, apesar de estar meio triste por causa de algo que ninguém sabia, além dela própria e de seu travesseiro, grande companheiro de noites inteiras insones e banhadas de lágrimas.
Curioso era que nem mesmo o fato de estar se sentindo linda servia pra amenizar a dor do maldito sapato a comer-lhe o calcanhar.
Mas aguentou-se e resistiu à tentação de voltar pra trocar por outro. Os motivos dessa insistência? Simples demais... Pensar na dor causada pelo acessório não a deixava pensar em outra dor, qualquer que fosse. E funcionava também como auto punição por cometer novamente a incrível besteira de sair do eixo por pessoas e motivos levianos.
Isso! O salto alto e o bico fino eram o seu instrumento de tortura numa manhã em que queria sentir qualquer dor, menos a que não conseguia evitar. Queria que a necessidade de se concentrar para manter o equilíbrio (coisa que, às vezes, não tem nem de pé no chão!) a desviasse de perceber o coração que batia apertado há alguns dias.
Era uma forma de se manter no controle. De sofrer por algo escolhido por ela e não provocado por terceiros. Algo que ela sabia quando ia acabar, afinal era só tirar o sapato e acabava a tortura.
Simples como cabeça de mulher!
Foi elogiada, foi vista, foi observada, mencionada... E manteve o sorriso, apesar de sentir a pele do calcanhar ser maltratada pelo atrito com o material sintético (sapatos baratos são assim).
Admitiu, porém, sua derrota para o calçado chiquérrimo depois do almoço, quando deu uma corridinha em casa e calçou a rasteirinha mais confortável que tinha na sapateira. Voltou para o trabalho com um machucado enoooorme no pé, que demorou dias para cicatrizar, mas voltou com o alívio de ter mandado embora mais uma dor e certa de que poderia mandar embora qualquer outra. Afinal, o salto agulha é uma tarefa que pouquíssimas mulheres conseguem cumprir lindamente e sem reclamar.